30 de dezembro de 2012

Receita (e votos) de Ano Novo

Porque ele se aproxima, "novinho em folha",
e faltando-me a verve para melhor o expressar, 
subscrevo e endereço-vos as palavras do poeta, 
com os votos de um magnífico Ano Novo.

"Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido (...)
Não precisa fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar de arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto da esperança
a partir de janeiro as coisas mudem (...)
Para ganhar um ano-novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo de novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre".

(Carlos Drummond de Andrade, "Receita de Ano Novo" In "Jornal do Brasil", 1997)


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2 de dezembro de 2012

O homem da mulher


Ultimamente, um anúncio televisivo apresenta vários chefs de cozinha acompanhados de algum dos seus familiares (filhos, netos, etc.). O grau de parentesco dos intervenientes é indicado numa legenda, e num dos vários anúncios pode ler-se: “Fulana de tal, mulher do chef  Beltrano…”. Esta expressão formal, vulgo “mulher de”, não tem equivalente no masculino, habitualmente correspondente às expressões “esposo” ou “marido”. De cada vez que deparo com isto, interrogo-me sobre a aparente arqueologia “machizóide” desta expressão. Com efeito, não é raro encontrar referência à “mulher do sr. director” ou ”à mulher do sr. presidente”, mas em contexto de linguagem formal não se encontram expressões como “o homem da Sra. professora” ou o “homem da sra. dra.” A excepção a esta regra encontra-se na linguagem popular. Cá pelo Norte, região pródiga em mulheres com “pêlo na benta” (metaforicamente falando, sublinhe-se), não é raro ouvi-las dizer: “o meu homem isto” ou “o homem daquela, aquilo”. Gosto deste equivalente possessivo para o lado feminino. Com efeito, se uma “mulher” pode pertencer a um homem, então um “homem” também pode pertencer a uma mulher. Sou por isso da opinião que se inclua esta expressão na linguagem formal e se leia ou se ouça, com idêntica solenidade, "o homem da sra. ministra" ou o "homem da cidadã...". Faça-se, assim, justiça linguística e possessiva. 

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