— Mas que lindo pezinho de Laranja Lima! (...)— Mas eu queria um pé de árvore grandão. (...)
Estava me sentindo o maior desgraçado da vida. (...) Sempre eu tinha que ser o último. Quando crescesse iam ver só. Ia comprar uma selva amazónica e todas as árvores que tocavam no céu, seriam minhas. (...) Emburrei. Sentei no chão e encostei a minha zanga no pé de Laranja Lima. Glória se afastou sorrindo. (...)
— Eu acho que sua irmã tem toda a razão. (...) Eu levantei assustado e olhei a arvorezinha. Era estranho porque sempre eu conversava com tudo, mas pensava que era o meu passarinho de dentro que se encarregava de arranjar fala.
— Mas você fala mesmo?
— Não está me ouvindo? - E deu uma risada baixinha.
Quase saí aos berros pelo quintal. Mas a curiosidade me prendia ali.
— Por onde você fala?
— Árvore fala por todo canto. Pelas folhas, pelos galhos, pelas raízes. Quer ver? Encoste seu ouvido aqui no meu tronco que você escuta meu coração bater. Fiquei meio indeciso, mas vendo o seu tamanho, perdi o medo. Encostei o ouvido e uma coisa longe fazia tique... tique...
— Viu? (...) Monte no meu galho.
Obedeci. (...) Desci adorando o meu pé de Laranja Lima. (...) Glória chegou mesmo na hora em que eu o abraçava.
— Adeus, amigo. Você é a coisa mais linda do mundo!
— Não falei a você?
— Falou, sim. Agora se vocês me dessem a mangueira e o pé de tamarindo em troca da minha árvore, eu não queria.
Ela passou a mão nos meus cabelos, ternamente.
— Cabecinha, cabecinha!...
Saímos de mãos dadas.
— Godóia, você não acha que sua mangueira é meio burrona?
— Ainda não deu para saber, mas parece um pouco.
— E o pé de tamarindo de Totoca?
— É meio sem jeitão, por quê?
— Não sei se posso contar.
(José Mauro de Vasconcelos, O Meu Pé de Laranja Lima, 1968)